O Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar um recurso para decidir quem é o responsável pela dívida de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) de um veículo financiado por meio de alienação fiduciária.
Nessa modalidade, o financiador, que normalmente é um banco ou instituição financeira, tem a posse do bem financiado, já que o próprio bem é a garantia do empréstimo, mas o comprador tem seu usufruto. Se o comprador não quitar o que deve, o banco pode tomar o automóvel.
Segundo especialistas, alguns Estados, como São Paulo e Minas Gerais, costumam cobrar as dívidas de IPVA que não foi pago pelos compradores dos veículos diretamente das instituições financeiras.
O caso levado ao Supremo questiona a constitucionalidade da Lei nº 14.937/2003, do Estado de Minas Gerais, que prevê que o credor fiduciante (a instituição financiadora) é contribuinte do IPVA. O comprador do automóvel é considerado apenas responsável solidário.
Segundo os contribuintes, a lei estadual fere o artigo 146, inciso III, alínea “a” da Constituição, que diz que a regulação de matéria tributária deve ser feita por meio de Lei Complementar. E o artigo 155, inciso III, que atribui aos Estados a iniciativa de instituir imposto sobre a propriedade de veículos automotores (RE 1.355.870).
Para o relator do processo, ministro Luiz Fux, as alegações de invasão da competência da União não têm fundamento, e a lei mineira, portanto, não tem vício formal. Por outro lado, o Estado tem autorização constitucional para instituir imposto sobre a propriedade, mas, no caso da alienação fiduciária, a propriedade do bem não é do credor, e sim do devedor. Portanto, o artigo 155 da Constituição foi afrontado.
O ministro levou em conta o argumento apresentado pela defesa do Banco Pan, que é parte no processo, de que o Supremo já tinha abordado a questão no julgamento do Tema 685.
“Naquela ocasião, o Supremo definiu que o contribuinte do IPVA nas hipóteses de alienação é sempre o devedor fiduciante. A defesa sustentou que, nesse caso em julgamento, é exatamente a mesma coisa”, afirma o advogado de defesa do banco.
Na época, a Corte analisou que a imunidade recíproca de IPVA em caso em que um ente público adquire veículo com alienação fiduciária. O relator considerou que o mesmo entendimento se aplica nas relações entre particulares. Ele foi acompanhado, até o momento, pelo ministro Alexandre de Moraes.
Fux destacou que o Supremo já decidiu que a posse direta do bem exercida pelo comprador tem “densidade material suficiente para os fins da incidência do IPVA”. Portanto, é do devedor fiduciante o status de contribuinte e sujeito passivo direto do imposto.
Ele propôs tese declarando inconstitucional “a eleição do credor fiduciário como contribuinte do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) incidente sobre veículo alienado fiduciariamente, ressalvada a hipótese da consolidação de sua propriedade plena sobre o bem”.
O voto também traz previsão de modulação para impedir que os bancos que já tenham pagado o IPVA possam ingressar com ação pedindo a devolução dos valores pagos, a partir da publicação da ata de julgamento do mérito pelo Supremo.
Contexto
Ao longo da última semana, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou dois outros casos envolvendo o tema da alienação fiduciária. Por um lado, a 1ª Seção, em julgamento de repetitivos, definiu que o credor fiduciário não pode ser responsável por dívida de IPTU de um imóvel financiado (Tema 1.158 – REsp 1.949.182, entre outros).
Já a 2ª Seção, sem vincular todo o Judiciário, decidiu que um imóvel em alienação fiduciária pode ser penhorado para quitar dívidas condominiais. Os ministros levaram em consideração o prejuízo que seria causado aos demais condôminos nessa situação (REsp 1.929.926, REsp 2.082.647 e REsp 2.100.103). A questão ainda será analisada em caráter vinculante, mas não há data definida para o julgamento (Tema 1.266, REsp 1.874.133 e REsp 1.883.871).
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal Valor Econômico