Em duas decisões recentes e incomuns, contribuintes conseguiram discutir compensações tributárias por meio de embargos à execução fiscal – processo usado para contestar cobrança de impostos. Em ambas, os magistrados validaram o encontro de contas apresentado pelas empresas.
As decisões são importantes, segundo tributaristas, porque a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é contra a análise de compensações tributárias em embargos à execução. Em 2021, a 1ª Seção adotou esse entendimento (EREsp 1795347), apesar de haver julgamento em recurso repetitivo de 2009 em sentido contrário.
No repetitivo, a tese firmada foi de que “a compensação efetuada pelo contribuinte, antes do ajuizamento do feito executivo, pode figurar como fundamento de defesa dos embargos à execução fiscal, a fim de ilidir a presunção de liquidez e certeza da CDA [Certidão de Dívida Ativa]” (Tema 294).
Em 2021, os ministros da 1ª Seção não chegaram a analisar o mérito por entender que as duas turmas de direito público têm o mesmo posicionamento e, portanto, não haveria divergência. Ambas entendem que os embargos à execução fiscal são específicos para discutir débitos. Há também posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) nesse mesmo sentido (ADPF 1023).
Os contribuintes, portanto, não poderiam usar como defesa contra essas cobranças a alegação de que existe um crédito negado na esfera administrativa – nem discutir se têm ou não direito a esse crédito.
Desde então, os tribunais regionais federais vêm replicando o entendimento da 1ª Seção e negando pedidos de contribuintes para discutir compensação em embargos. Alguns contribuintes, no entanto, têm conseguido sensibilizar os magistrados.
Uma decisão recente na primeira instância foi obtida por uma empresa do setor de saúde. O contribuinte alegou, nos embargos, que já tinha ingressado com a contestação antes da segunda decisão do STJ, proferida pela 1ª Seção (processo nº 5062845-47.2019.4.02.5101).
A defesa alegou que a empresa entrou com pedidos de compensação na Receita Federal e que, mesmo assim, R$ 12,4 milhões, referentes a PIS e Cofins, foram inscritos na dívida ativa.
Na decisão, o juiz Manoel Rolim Campbell Penna, da 6ª Vara Federal de Execução Fiscal do Rio de Janeiro, afirma que, se o Fisco não reconhecer um pedido de compensação, deve efetuar o lançamento e notificar o contribuinte a respeito da dívida que julga existente, abrindo espaço para o contraditório e a ampla defesa em processo administrativo de lançamento tributário, o que não ocorreu no caso dos autos.
Em segunda instância, uma empresa de logística também conseguiu afastar a restrição do STJ. A decisão é da 4ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2).
No caso, os desembargadores levaram em consideração que a mudança de entendimento do STJ transitou em julgado em abril de 2022 e que os embargos à execução tinham sido apresentados em 2010, e a sentença proferida em 2017. Assim, ainda estava vigente o posicionamento anterior dos ministros, o que justifica o reconhecimento da compensação de débitos de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins com créditos de IRRF (processo nº 0506600-59.2010.4.02.5101).
Os tributaristas, no entanto, reconhecem que essas decisões são exceções. Na maioria dos casos, os pedidos dos contribuintes são negados. Foi o que aconteceu com uma empresa de entretenimento em 2021, quando a mesma 4ª Turma Especializada do TRF-2 negou recurso do contribuinte com base no fato de que “não é possível a alegação de compensação no âmbito dos embargos à execução se não houver homologação do crédito em sede administrativa ou judicial antes do ajuizamento da execução fiscal” (processo nº 0014218-10.2013.4.02.5101).
No TRF-1, a 7ª Turma também negou o pleito do contribuinte, alegando que “a compensação tributária deve ser pleiteada em ação própria, não podendo ser determinada judicialmente em embargos à execução fiscal” (processo nº 0001277-04.2005.4.01.3301).
Em outro caso, uma comerciante de peças automotivas teve de converter os embargos à execução em ação anulatória para superar a restrição imposta pelo entendimento do STJ. Na primeira instância, o juiz acatou a conversão da ação e homologou a compensação pleiteada pelo contribuinte. O recurso do Estado ainda não foi julgado em segunda instância (processo nº 0012727-20.2018.4.03.6182).
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal Valor Econômico