Uma decisão da 3ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Amazonas isentou uma empresa de afretamento marítimo do pagamento de impostos sobre o Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM). O entendimento foi o de que a nova Lei das Subvenções (nº 14.789/23) não abrangeu essa contribuição específica.
No caso, com a decisão que impediu a incidência do Imposto de Renda (IRPJ), CSLL, PIS e Cofins, a empresa de afretamento deixou de recolher cerca de R$ 1,5 milhão, referente a um ano.
O adicional é alocado no Fundo de Marinha Mercante e direcionado para as empresas de transporte marítimo. Mas só pode ser usado para renovação de frota ou construção de novos navios ou balsas, como forma de o governo apoiar o desenvolvimento da indústria naval brasileira. Assim, configura uma subvenção.
Quando foi editada, a Lei nº 14.789/2023 revogou todos os artigos existentes até então a respeito das subvenções, mas deixou de fora o artigo 68 da Lei nº 4.506/64, que diz que o AFRMM não compõe a receita bruta operacional das empresas.
Foi levado à Justiça, então, o argumento do princípio da especialidade: na existência de duas normas conflitantes, o imbróglio deve ser resolvido aplicando aquela que é especial, mais específica a respeito de um determinado assunto. No caso, o dispositivo da lei de 1964 que foi mantido dispõe especificamente sobre as empresas de navegação.
O juiz Ricardo Augusto Campolina de Sales considerou que, ao não revogar o artigo quando teve a oportunidade, o ente legislativo manteve em vigor uma legislação mais benéfica, que deve prevalecer. “Entendo que a cobrança, da forma como exercida pelo ente no caso em questão, estaria ferindo o princípio da legalidade tributária, visto que o legislador, podendo revogar, assim não o fez, mantendo em vigor legislação mais benéfica, o que nos leva a analisar o caso sob a ótica democrática do tributo”, afirma.
O magistrado concluiu que, nesse caso, o Judiciário não pode “criar obrigação tributária ainda dada como válida perante o Legislativo”. Entender que houve revogação tácita, acrescenta, seria extrapolar matéria tributária “restrita ao regramento legal específico” (processo nº 1017334-28.2024.4.01.3200).
O Ministério da Fazenda divulgou que a lei poderia trazer R$ 35 bilhões aos cofres públicos. Isso gerou uma reação do setor produtivo e três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando pontos da nova norma.
Uma delas foi apresentada pelo Partido Liberal e aponta que a União desconsiderou as prioridades estabelecidas por Estados e municípios na definição de suas políticas fiscais, além de ter tratado de tema que só poderia ser instituído por lei complementar (ADI 7551).
Autora de outra ação, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) argumenta que a nova modalidade de tributação impede Estados e municípios de incentivar o desenvolvimento de determinadas atividades por meio de incentivos fiscais. A entidade defende ainda que a sistemática desrespeita o conceito constitucional de receita (ADI 7604).
Por fim, a Confederação Nacional do Comércio (CNC) também foi ao Supremo, corroborando o argumento da violação ao conceito constitucional de renda e receita porque a nova lei parte do princípio de que as subvenções constituem receitas tributáveis (ADI 7622).
Devido à complexidade da controvérsia, muitas empresas ainda estão avaliando se faz sentido judicializar as cobranças agora.
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal Valor Econômico