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10 de Julho de 2024Três recentes decisões judiciais afastaram a tributação de crédito presumido de ICMS – tipo de benefício fiscal dado a empresas. Duas delas são sentenças proferidas pela Justiça Federal de São Paulo e a outra é uma liminar dada pelo desembargador Rubens Calixto, da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3). As ações questionam a aplicação da Lei das Subvenções (nº 14.789/2023), uma das apostas do Ministério da Fazenda para cumprir as metas fiscais deste ano.
São as primeiras sentenças da 3ª Região, que engloba São Paulo e Mato Grosso do Sul, que se tem notícia. Uma delas, favorável a uma indústria têxtil, afastou a cobrança de PIS, Cofins, Imposto de Renda (IRPJ) e CSLL, assim como os efeitos da nova norma, editada no fim do ano passado. A outra foi parcialmente favorável a uma empresa de laticínios, vedando a incidência até a entrada em vigor da nova legislação.
A partir da lei atual, fruto da conversão da Medida Provisória 1.185/2023, a União passou a poder cobrar imposto sobre os benefícios fiscais de ICMS. Porém, para tributaristas, a legislação é inconstitucional e desrespeita a jurisprudência sólida do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Na visão deles, há uma ofensa ao pacto federativo e à própria natureza do crédito presumido, que é diferente dos outros tipos de benefícios – como isenção, diferimento, redução de base de cálculo ou alíquota.
O crédito presumido seria o que a doutrina chama de “grandeza positiva”, enquanto os demais são “grandezas negativas”. Isso quer dizer que eles têm efeitos contábeis diferentes – em um o crédito é dado à empresa e representa uma renúncia fiscal para o Estado e, nos outros, há uma desoneração, que reduz despesa para o contribuinte. Esse foi um dos principais fundamentos na tese estabelecida pela 1ª Seção do STJ, em abril do ano passado, em recurso repetitivo (Tema 1.182).
Nesse acórdão, o ministro relator Benedito Gonçalves reforçou julgamento anterior, em que se exclui a tributação de IRPJ e CSLL para crédito presumido. Ficou definido que “a concessão do crédito presumido de ICMS representa renúncia a parcela de arrecadação, de modo que a tributação pela União desses valores significaria ‘a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo” (EResp 1.517.492).
Esses dois precedentes foram citados pelo juiz Alexey Suusmann Pere, da 2ª Vara Federal de Guarulhos (SP), que concedeu sentença a uma indústria têxtil. Na visão dele, essa é uma jurisprudência “consolidada” de que o crédito presumido é um “incentivo fiscal voltado à redução de custos”, portanto, não assume “natureza jurídica de receita ou faturamento para efeito de composição da base de cálculo do IRPJ e da CSLL”.
Ele lembrou ainda de uma ação pendente de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF), em que houve a formação de maioria, no Plenário Virtual, pela exclusão dos créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins (RE 835818). O placar, porém, foi zerado após pedido de destaque – o que transferiu o caso para o plenário físico.
Para o juiz, a nova lei editada ano passado “não tem o condão de alterar a própria natureza jurídica do instituto”. Por isso, permitiu que o contribuinte excluísse os quatro impostos federais da base de cálculo do benefício fiscal (processo nº 5002069-31.2024.4.03.6119).
O advogado que defende o contribuinte, diz que o entendimento confirma a jurisprudência desde 2017 nos tribunais – que não poderia ser alterada pela nova lei. “Ela confirma que o crédito presumido, por sua natureza, não deve integrar a base de cálculo. É um benefício concedido pelo Estado, sem recuperação nas etapas seguintes”, afirma.
Segundo ele, as decisões sobre crédito presumido têm sido mais favoráveis aos contribuintes do que outros benefícios fiscais por conta dos precedentes do STJ. Os entendimentos favoráveis às companhias, acrescenta, mostram que “o Judiciário tem prestado atenção para a segurança jurídica e o pacto federativo”.
Já a outra sentença foi dada pela 6ª Vara Cível Federal de São Paulo para uma empresa de laticínios. Porém, sem a mesma abrangência. A juíza Denise Aparecida Avelar concordou que o crédito presumido não pode ser tributado, mas entende que a nova lei não viola o pacto federativo por ser “expressa ao dispor que o valor do crédito fiscal não será computado na base de cálculo do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins”.
A legislação estabelece requisitos para ser disponibilizado o crédito, assim como mecanismos de habilitação na Receita Federal. Por isso, na visão da juíza, “após a vigência da Lei nº 14.789/2023, exige-se o preenchimento dos requisitos por esta previstos, para que o crédito presumido de ICMS não seja computado na base de cálculo do IRPJ e CSLL”. O caso envolvia apenas o afastamento da tributação de IRPJ e CSLL (processo nº 5034616-21.2023.4.03.6100).
O advogado que representou a empresa, diz que vai recorrer para afastar a tributação também a partir da nova legislação. Mas já vê a sentença como positiva por ter confirmado o precedente do STJ. “O argumento do STJ foi constitucional. Ele diz que a tributação é invasão da União na receita do Estado. O fato é que a lei nova não muda esse argumento.”
Em um agravo de instrumento, julgado pelo desembargador Rubens Calixto, uma empresa de produtos de limpeza e higiene conseguiu uma tutela para não pagar PIS e Cofins sobre o benefício de ICMS. Para Calixto os créditos presumidos “constituem verdadeiras renúncias fiscais dos Estados, o que impede a União de tributá-los” (processo nº 5015730-04.2024.4.03.0000).
O advogado que atuou no caso, também elogia a preservação de julgados do STJ, “afastando expressamente a Lei nº 14.789/23, que não teria o condão de alterar a natureza jurídica de renúncia fiscal do benefício”. O valor da causa é de R$ 18 milhões.
Em outra sentença, a primeira que se teve notícia, a 6ª Vara Federal do Rio de Janeiro, da 2ª Região, afastou a cobrança de IRPJ e CSLL sobre crédito presumido de ICMS. Não é tão abrangente como a de São Paulo, que alcança quatro tributos.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) não quis comentar o assunto.
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal Valor Econômico