A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vai analisar a modulação adotada pela 1ª Seção no julgamento que definiu que a base de cálculo das contribuições ao Sistema S não deve ficar restrita a 20 salários mínimos (hoje R$ 30,36 mil). O relator de um dos casos julgados aceitou recurso apresentado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).
Em março de 2024, a 1ª Seção definiu que as chamadas “contribuições de terceiros” ou “parafiscais” devem incidir sobre toda a folha de pagamentos das empresas. Para limitar o impacto do entendimento, os ministros modularam a decisão.
Pela modulação, a decisão vale a partir da publicação da ata de julgamento e estariam ressalvadas as ações judiciais ajuizadas até a data de início do julgamento – 25 de outubro de 2023 – e com decisão favorável.
A modulação, porém, não encerrou a questão. Desde o julgamento, no ano passado, foram apresentados e negados nove embargos de declaração, de diversas partes e interessados no processo. E, agora, os contribuintes que acompanham essa disputa se depararam com uma situação inusitada: a PGFN, que representa a União, apresentou embargos de divergência nos dois recursos julgados – em um o recurso foi aceito e no outro, não.
A questão foi discutida em recursos repetitivos, e foram destacados dois processos como representativos da controvérsia: um recurso opondo a União à empresa de cosméticos Cigel (REsp 1898532), sob relatoria de Og Fernandes, e outro da distribuidora de alimentos GCA (REsp nº 1905870), relatado hoje por Maria Thereza de Assis Moura.
Nos recursos, a PGFN destaca que o artigo 927 do Código de Processo Civil (CPC), em seu parágrafo 3º, prevê que só nos casos de “alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica”.
O problema é que quando a 1ª Seção uniformizou seu entendimento, havia poucos precedentes sobre o tema: duas decisões colegiadas da 1ª Turma e algumas decisões monocráticas (de um só ministro). Segundo a PGFN, “a existência de precedentes isolados de uma única turma julgadora não caracteriza a existência de jurisprudência dominante sobre determinada matéria, sendo insuficiente para preencher o requisito contido no artigo 927, parágrafo 3º, do CPC” e que justificaria a modulação.
Ao analisar o pedido da PGFN, o ministro Og Fernandes admitiu que poderia haver possível divergência a respeito do conceito de jurisprudência dominante. Por isso, admitiu os embargos de divergência apresentados, abrindo espaço para manifestação das partes, para posterior análise. Mas a ministra Maria Thereza não vislumbrou a mesma possibilidade e negou seguimento ao recurso da União. O julgamento agora caberá à Corte Especial.
O advogado que representa a Cigel no processo, explica que os contribuintes rechaçam a argumentação da União. Isso porque ela tenta acabar com qualquer modulação dos efeitos.
De acordo com ele, o critério da modulação já tinha instituído uma exigência ao contribuinte que estava fora do seu controle – a obtenção de uma decisão favorável. “Como impor ao contribuinte uma limitação que não é dele?”, diz o advogado.
“Esse foi um dos primeiros problemas dessa modulação, que eu julgo completamente atípica e fora de qualquer parâmetro de razoabilidade mínima”, afirma. “O provimento ou não da decisão judicial não depende do contribuinte”, acrescenta.
Agora, a tentativa da União de acabar com a modulação também não deve prosperar, diz o advogado, uma vez que “a própria decisão da ministra Regina Helena Costa [então relatora] traz uma série de questões da jurisprudência da Corte à época”. “Não tem por que falar que não existia.”
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal Valor Econômico