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11 de Junho de 2024A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por 3 votos a 2, cassou decisões da Justiça do Trabalho que haviam condenado a Tim a pagar os direitos trabalhistas a uma mulher que prestou serviços de sênior account ao longo de seis anos, via pessoa jurídica (PJ) — fenômeno conhecido como pejotização.
Na origem, a juíza Ana Paula Freire Rojas, da 18ª Vara do Trabalho de São Paulo (Zona Sul), havia declarado nulo o contrato de PJ e reconhecido o vínculo empregatício, na função de senior account, com remuneração conforme a média dos últimos doze meses de trabalho. De acordo com a inicial, a trabalhadora recebia R$ 7 mil nos meses finais. A decisão foi mantida pela 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2).
Prevaleceu a visão do decano, ministro Gilmar Mendes, para quem “tendo em vista o entendimento firmado no julgamento da ADPF 324, conclui-se que não se configura relação de emprego entre a contratante e o empregado da empresa contratada na terceirização, também não há como se reconhecer o vínculo empregatício entre os empresários individuais, sócios de pessoa jurídica contratada para a prestação de serviços, prestadores de serviços autônomos ou figurantes de relações jurídicas de natureza cível/empresarial e a empresa contratante”.
Para o ministro Gilmar Mendes, que foi seguido pelos colegas André Mendonça e Dias Toffoli, a controvérsia dos autos, que tratava de pejotização, “corresponde à licitude da ‘terceirização’ da atividade-fim da empresa tomadora através de contratos de prestação de serviços profissionais por meio de pessoas jurídicas ou sob a forma autônoma, a chamada ‘pejotização’”.
Sobre o tema da terceirização, o ministro afirma que, por ocasião do julgamento da ADPF 324, apontou “que o órgão máximo da justiça especializada (TST) tem colocado sérios entraves a opções políticas chanceladas pelo Executivo e pelo Legislativo”.
“Ao fim e ao cabo, a engenharia social que a Justiça do Trabalho tem pretendido realizar não passa de uma tentativa inócua de frustrar a evolução dos meios de produção, os quais têm sido acompanhados por evoluções legislativas nessa matéria”, afirma Mendes.
O decano do STF afirma que “o que se observa no contexto global é uma ênfase na flexibilização das normas trabalhistas. Com efeito, se a Constituição Federal não impõe um modelo específico de produção, não faz qualquer sentido manter as amarras de um modelo verticalizado, fordista, na contramão de um movimento global de descentralização”.
Mendes também cita o entendimento do ministro Luiz Fux no RE 958,252 (Tema 725 da repercussão geral), segundo o qual é “essencial para o progresso dos trabalhadores brasileiros a liberdade de organização produtiva dos cidadãos, entendida essa como balizamento do poder regulatório para evitar intervenções na dinâmica da economia incompatíveis com os postulados da proporcionalidade e da razoabilidade”.
Por isso, votou para julgar procedente a reclamação movida pela Tim, de forma a cassar as decisões que haviam identificado vínculo empregatício entre a prestadora de serviços via PJ.
A visão de Edson Fachin sobre as reclamações a favor da pejotização
Para o ministro Edson Fachin, relator, que ficou vencido ao lado de Nunes Marques, a contratação de um trabalhador pessoa física como pessoa jurídica por uma determinada empresa (pejotização), “a existência de fraude na contratação mediante formação de vínculo formal entre empresas, ou ainda, a contratação de um trabalhador pessoa física por uma plataforma digital de intermediação de serviços são hipóteses que sequer foram aventadas no julgamento dos paradigmas invocados [ADPF 324, da ADC 48 e da ADI 5625], não se mostrando possível, derivar desses julgados a chancela, sob o aspecto constitucional, da substituição de relações jurídicas empregatícias à que apenas se atribui roupagem de contrato formal, inclusive sob o prisma do cumprimento das obrigações trabalhistas e fiscais”.
A abordagem de princípios como livre iniciativa, legalidade, proteção ao emprego, ainda que invocados como argumentos que conduziram às conclusões alcançadas pelo Tribunal, na visão do ministro, “não constituem fundamento autônomo que autorize a expansão da fundamentação lá adotada para cada situação específica e diversa levada à apreciação da Justiça do Trabalho”.
O ministro afirma que “no julgamento dos paradigmas rechaçou-se a presunção da fraude pela terceirização, mas se anotou que o seu exercício abusivo poderia violar a dignidade do trabalhador, de modo que cabe, assim, à Justiça Trabalhista, diante da primazia da realidade, reconhecer os elementos fáticos que constituem a relação de emprego, nos termos do art. 114 da Carta da República”.
Para Fachin, “admitir conclusões genéricas sobre a licitude de determinada espécie de contratação sem atenção às peculiaridades dos casos concretos subverte os princípios fundamentais do direito do trabalho e esvazia de significado o art. 114 da Constituição, que permanece hígido e vigente”. O artigo mencionado por Fachin trata da competência da Justiça do Trabalho. O ministro, contudo só foi seguido por Nunes Marques.
O pedido da PGR sobre as reclamações em prol da pejotização
Foi neste processo que o então procurador-geral da República, Augusto Aras, havia pedido a instauração de incidente de assunção de competência (IAC) para que fosse uniformizada a jurisprudência sobre reclamações nos casos em que a Justiça do Trabalho identificar fraude à caracterização do vínculo empregatício.
Para o então PGR, seria inadmissível o uso da reclamação na hipótese dos autos. “A discussão em torno de eventual desacerto por parte da Justiça do Trabalho há de ser implementada pelas vias recursais ordinárias, as quais possibilitam a reforma das decisões pela reapreciação dos fatos e das provas objeto da instrução processual”, afirmou.
O pedido da PGR, contudo, foi julgado prejudicado por Edson Fachin em uma decisão monocrática anterior.
A posição da PGFN sobre a pejotização
Também foi neste processo que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirmou que o movimento do STF de cassar decisões trabalhistas e validar a pejotização pode levar a situações anti-isonômicas do ponto de vista fiscal e tributário.
O problema, para a PGFN, é a Corte derrubar em alguns casos decisões trabalhistas que, em sua visão, não tinham relação com os precedentes citados pelas empresas.
A PGFN reconheceu que a prestação de serviço por profissionais na modalidade PJ não é, por si só, considerada fraude à relação de emprego. Ainda assim, frisou não ser possível admitir que um contrato seja firmado apenas para driblar a legislação, sem se considerar a realidade.
“Tal artifício aniquilaria o dever que vincula profissionais liberais qualificados ao pagamento de imposto de renda e desfalcaria o caixa da Previdência social, afastando-se da incidência da contribuição social patronal”, explicou o procurador Carlos de Araujo Moreira, que assina a peça.
Segundo Moreira, a existência de fraude na relação de emprego torna “irrelevante a roupagem formal que envolve o empregado”, de forma que é “inviável que se impeça que a Justiça especializada exerça sua competência e declare nulos os atos que contrariem a legislação”.
O procurador da Fazenda Nacional sustentou que desvincular a relação de emprego de seus elementos concretos, permitindo que um contrato meramente formal seja oculto sob um “manto fictício”, permitiria à parcela mais privilegiada da sociedade (empresas e profissionais altamente qualificados) fugir do dever de pagar impostos e contribuições.
O que diz o advogado da Tim
Procurado, o advogado responsável pela defesa da Tim, afirma que “a decisão do STF neste caso, confirma a legalidade da terceirização, parceria e pejotização adotada pela empresa (Sênior Account)”.
Ele ressalta a importância da observância dos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, que permitem a busca por maior eficiência e competitividade sem impor um modelo específico de produção.
A decisão foi tomada na RCL 60.620, em julgamento no plenário virtual que se encerrou às 23h59 desta segunda-feira (10/6).
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal jurídico JOTA