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3 de Outubro de 2023Um pedido de vista interrompeu a discussão sobre a liquidação antecipada do seguro-garantia na 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), com o placar em 1 a 0 contra o contribuinte. O relator, ministro Sérgio Kukina, permitiu a liquidação antecipada citando a jurisprudência do tribunal nesse sentido. Em seguida, o ministro Gurgel de Faria pediu vista, alegando sentir “incômodo” em “apenas referendar a jurisprudência” em relação à matéria.
A liquidação antecipada significa, na prática, a conversão em valores do seguro-garantia ofertado pelo contribuinte antes do trânsito em julgado da execução fiscal. O STJ tem decidido a favor da liquidação antecipada dos valores, desde que o levantamento efetivo ocorra após o trânsito em julgado.
Porém, tributaristas apontam que a 1ª Turma tem seguido os precedentes da 2ª Turma em relação ao tema, sem que seus integrantes tenham, de fato, enfrentado a controvérsia. Ou seja, nos julgamentos envolvendo o tema, o colegiado faz referência a julgados anteriores, mas não discute o mérito propriamente dito.
Caso a 1ª Turma passe a decidir de forma diferente da 2ª Turma em relação ao assunto, abre-se a possibilidade de a matéria subir para a 1ª Seção, que decide eventuais divergências de jurisprudência entre as duas turmas de direito público. O colegiado pode ainda analisar o tema por meio de recursos repetitivos.
Debate
No caso concreto (AREsp 2310912/MG), ao negar provimento ao recurso da empresa, o relator, ministro Sérgio Kukina, citou precedentes com decisões no mesmo sentido, entre eles o AgInt no AREsp 1.646.379/RJ (2ª Turma, julgado em 21/9/2020); AgInt no AREsp 1.756.612/RJ (1ª Turma, julgado em 3/10/2022) e o AgInt no AREsp 1.843.540 (1ª Turma, julgado em 22/10/2021).
O ministro Gurgel de Faria afirmou que, embora os dois precedentes da 1ª Turma citados pelo relator sejam de sua relatoria, gostaria de pedir vista para refletir melhor sobre o tema. “Confesso que esse é um tema que me incomoda. Porque [o débito] está devidamente garantido. É um seguro-garantia que geralmente é feito por uma instituição sólida, uma instituição bancária. Quando a gente sabe que muitas empresas passam por momentos difíceis”.
O julgador disse que passou a pensar no assunto após proferir decisão monocrática em um caso envolvendo uma empresa em recuperação judicial. “Era um caso envolvendo uma empresa em recuperação judicial. A jurisprudência é assim [favorável à liquidação antecipada] mas, se for aplicada de imediato, pode até prejudicar a recuperação judicial da empresa”, comentou.
O relator, então, admitiu que a situação também lhe causa “alguma intranquilidade”. “Verdadeiramente, não vejo muita lógica de se deslocar o valor da garantia, sendo que esta providência vai gerar custos adicionais à parte executada”, disse.
O ministro Sérgio Kukina ainda pontuou que o momento é oportuno para o debate, uma vez que a Lei 14.689/2023, que restabeleceu o voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), trazia a vedação à liquidação antecipada do seguro garantia, trecho que acabou sendo vetado pela presidência.
A ministra Regina Helena Costa afirmou que a discussão deve levar em conta a distinção entre débito tributário e não tributário. Segundo ela, na seara tributária, a suspensão da exigibilidade do débito só pode ser disciplinada por lei complementar. Ela afirmou, no entanto, acreditar que o assunto “merece uma nova reflexão”.
Já o ministro Paulo Sérgio Domingues afirmou que várias decisões de sua autoria em 2ª grau foram modificadas pelo STJ devido à sua posição de aceitar o seguro-garantia sem a liquidação antecipada. “A liquidação traz um ônus para a parte mesmo, porque encarece o próximo seguro [a ser contratado]”, disse.
Julgamento sob rito repetitivo
A discussão sobre a possibilidade de liquidação antecipada do seguro-garantia pode ser analisada como repetitivo pelo STJ. Cinco processos sobre o tema (REsp 2.077.314/SC, AREsp 2.370.994/SP, AREsp 2.378.207/SP, AREsp 2.376.897/SP e AREsp 2.349.081/SP) foram selecionados pela ministra Assusete Magalhães como possíveis representativos da controvérsia.
Segundo Magalhães, que é presidente da Comissão Gestora de Precedentes, o tema traz “expressivo impacto jurídico e financeiro, haja vista ter o condão de influir em inúmeras execuções fiscais em trâmite no país”. Em agosto a ministra pediu o posicionamento do Ministério Público sobre a afetação dos casos como repetitivos.
O tema foi encaminhado à comissão pela presidente do STJ, ministra Maria Thereza de Assis Moura, também em agosto. Por meio de um recurso repetitivo o tribunal firma uma tese sobre um tema alvo de múltiplos recursos no Judiciário, e o entendimento deve necessariamente ser seguido pelas demais instâncias e pelo Carf em casos idênticos.
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal jurídico JOTA