Farmacêuticas vencem na Justiça disputa sobre isenção de ICMS
27 de Setembro de 2024Solução de Consulta COSIT nº 267, de 27 de setembro de 2024
30 de Setembro de 2024Os planos de stock options estão previstos no art. 168 da Lei das Sociedades Anônimas e, mediante a outorga das opções de compra das ações, conferem ao colaborador a possibilidade de aquisição de participação societária futura na companhia dentro das condições estabelecidas no plano.
A operacionalização dos planos se dá pelos seguintes passos:
- Aprovação do Plano de Outorga de Opções de Compra de Ações pela Companhia e definição dos requisitos e condições, como preço predeterminado para aquisição das ações, período de carência (vesting) etc.;
- Oferta aos colaboradores elegíveis da possibilidade de firmarem contratos de outorga da opção de compra;
- Superado o vesting, o colaborador-participante analisará a conveniência de exercer as suas opções;
- Por fim, o participante poderá vender as ações. Nesse momento, apenas se verificada variação positiva em relação ao preço de aquisição, terá ganho de capital.
Litígio entre fisco e contribuinte: caráter remuneratório X mercantil
Em análise dos planos de stock options, a Receita Federal passou a entender que o ganho eventualmente experimentado entre a outorga das opções e seu exercício teria natureza remuneratória.
Na visão do fisco, caso inexistisse o vínculo empregatício entre companhia e colaborador a aquisição incentivada das ações não seria possível. Assim, o aumento patrimonial supostamente experimentado pelo colaborador no momento do exercício das opções decorreria de contraprestação ao trabalho por ele prestado.
Com base em tal interpretação, a RFB passou a autuar tanto a pessoa física participante dos planos quanto a companhia, passando a lhes exigir, respectivamente, (i) imposto de renda sobre rendimento decorrente do trabalho, pela alíquota progressiva até 27,5%; e (ii) contribuições previdenciárias e de terceiros sobre os valores pagos.
De outro lado, na visão do contribuinte os contratos de stock options teriam natureza mercantil, devido à presença das três características basilares desses instrumentos: (i) onerosidade; (ii) voluntariedade; e (iii) risco.
Onerosidade, pois a aquisição das ações efetuada pelo colaborador quando do exercício não é gratuita; há efetivo desembolso. Voluntariedade, porque a adesão aos planos de ações é opcional. Risco, pois o ganho do colaborador depende da valorização da ação, experimentada na variação positiva entre o preço pago no exercício e o valor da venda; caso inexistente tal fenômeno, o prejuízo é tangível.
Assim, a tributação dos planos de stock options seria aquela incidente no “delta positivo” entre o valor de exercício das opções e o valor de alienação das ações. Apenas se verificada essa variação positiva, incidiria Imposto de Renda Pessoa Física à alíquota própria de ganho de capital.
Julgamento do Tema Repetitivo 1.226
Após anos de controvérsia nos contenciosos administrativo e judicial, em 11/9/2024 a 1ª Seção do STJ julgou o Tema 1.226, sob relatoria do ministro Sérgio Kukina, afetado para definir a “natureza jurídica dos Planos de Opção de Compra de Ações de companhias por executivos (Stock option plan), se atrelada ao contrato de trabalho (remuneração) ou se estritamente comercial”.
Os Recursos Especiais 2.069.644 e 2.074.564, afetados como repetitivos, versam exclusivamente sobre o Imposto de Renda da Pessoa Física – se devido pela tabela progressiva, enquanto remuneração, ou enquanto ganho de capital.
Por 6×1, o STJ reconheceu a natureza mercantil das stock options. O voto do relator analisou detidamente os argumentos do fisco e do contribuinte e sua conclusão se baseou em três fundamentos principais: (i) presença dos elementos do contrato mercantil; (ii) inexistência de previsão legal enquadrando o stock options como remuneração; e (iii) indisponibilidade econômica da renda no momento do exercício das opções.
Elementos do contrato mercantil
Como mencionado, os elementos dos planos de stock options a caracterizá-los como mercantis são voluntariedade, onerosidade e risco.
A voluntariedade foi acertadamente reconhecida pelo relator, ao afirmar que “a adesão ao SOP é totalmente voluntária e […] mesmo quando efetivada a opção, o empregado não é obrigado a concretizar a compra das ações imediatamente: pode considerar as flutuações do mercado e o momento para ele mais vantajoso para essa aquisição”.
Igualmente, o caráter oneroso e negocial da avença foi reconhecido pelo relator ao mencionar que “uma vez exercida, por elas, a opção de compra, tem-se a concretização de nítido negócio de compra e venda de ações, de natureza estritamente mercantil, o qual perfará suporte fático de incidência de imposto de renda de pessoa física quando da posterior venda dessas, se ocorrido ganho de capital”.
Já o elemento “risco” foi assinalado pelo acórdão em passagem na qual cita-se o professor Sérgio Pinto Martins, que reconheceu o risco inerente à volatilidade do mercado de ações, que só importará em ganho ao alienante caso verificada a variação positiva: “O empregado assume, portanto, o risco da flutuação do valor das ações”.
Inexistência de previsão legal
Historicamente, o fisco tentou amparar seu posicionamento no art. 33 da Lei 12.973/2014, que trata da possibilidade de a pessoa jurídica que remunera seus colaboradores por meio de pagamento baseado em ações deduzir tais valores da apuração do IRPJ e da CSLL.
Contudo, diferentemente do que ocorre no stock option, na hipótese legal a empresa remunera o colaborador ao dar-lhe gratuitamente as ações; não há desembolso de valores por parte do colaborador. Tal diferenciação foi acertadamente realizada pelo voto do relator:
Isso porque, do caput do dispositivo, extrai-se que a norma se refere aos casos em que a remuneração do contratado se efetua “por meio de acordo com pagamento baseado em ações”. Em outros termos: a empresa de modo gratuito remunera seus empregados por meio de ações, como estabelecido em acordo.
Ausência de disponibilidade econômica no momento do exercício
Por fim, o acórdão também reconheceu que a tributação da maneira pretendida pelo fisco importaria em violação ao art. 43 do CTN, na medida em que implicaria tributação de renda presumida, ainda não realizada e, pois, incompatível com o regime de caixa próprio da apuração de Imposto de Renda das Pessoas Físicas:
Como se vê, “a renda só deve ser tributada quando realizada, isto é, quando o acréscimo de valor entra efetivamente para o patrimônio do titular” (g.n.), situação ausente no momento da simples opção de compra de ações no SOP. Isso porque, como já dito anteriormente, o empregado está apenas a optar por adquirir um bem (ação) e, posteriormente, efetiva o pagamento acertado para tanto (dispêndio). Nesse momento, não se tem ainda “renda realizada”, riqueza nova advinda de exploração do patrimônio do titular.
E as contribuições previdenciárias e de terceiros?
Embora o objeto do julgamento vinculante se refira ao IRPF, é notável que o cerne do acórdão do STJ foi analisar a natureza jurídica dos contratos de stock options a partir de suas características. Ao assim fazê-lo, concluiu pelo seu caráter mercantil, reconhecendo a incompatibilidade da natureza remuneratória defendida pelo fisco.
Embora a aplicação do julgado aos casos envolvendo contribuições previdenciárias e de terceiros possa não ser automática, é fato que a ratio decidendi que conduz à conclusão pela ausência de natureza remuneratória dos valores foi pavimentada no Tema 1.226. Assim, a deferência à segurança jurídica traz a legítima expectativa de que os litígios previdenciários sigam o mesmo desenlace do leading case: favoravelmente ao contribuinte, após anos de luta.
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal jurídico JOTA