
Notícia Siscomex Importação nº 115/2025
17 de Novembro de 2025
Decisões judiciais obrigam Receita a reanalisar compensações fiscais
17 de Novembro de 2025O Judiciário tem limitado o uso de créditos tributários oriundos de ações movidas por associações genéricas, por não representarem um setor específico. Em recentes decisões, Tribunais Regionais Federais (TRFs) e o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceram a ilegitimidade de três delas, que tentam vender decisões favoráveis em busca de honorários e captar filiados até pelas redes sociais.
Em paralelo, a Receita Federal já tem negado pedidos de compensação tributária baseados nessas sentenças coletivas, o que tem motivado contribuintes a moverem novas ações judiciais. Uma empresa de São Paulo conseguiu, neste mês, sentença que determina a reanálise de pedido de homologação indeferido pelo Fisco, afastando a alegação de que a associação é genérica.
Segundo advogados, o objetivo das associações genéricas, ao conseguirem decisões favoráveis aos contribuintes, é vendê-las ao custo de uma filiação – que pode chegar a 30% do valor do imposto a ser devolvido. A promessa é recuperar milhões de reais em tributos, de forma retroativa, por 15 ou 20 anos. As entidades têm abordado empresas e escritórios de advocacia para “turbinar” créditos de clientes.
A comercialização tem ocorrido com grandes teses tributárias. A principal é a tese do século, em que o STF permitiu a exclusão do ICMS da base do PIS/Cofins. Mas também ocorre com a tese do Sistema S, sobre a limitação da base de cálculo em 20 salários mínimos das contribuições destinadas a terceiros, e, mais recentemente, com a tributação das subvenções de ICMS e com o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).
Grandes empresas, de acordo com advogados, têm comprado as decisões, pois elas veem como solução para resolver o caixa no curto prazo, em um cenário de pressão pela alta taxa de juros, a Selic. É mais rápido do que entrar com a própria ação e esperar acórdão favorável: após a filiação, já é permitido usar a sentença da entidade para buscar precatórios ou fazer a compensação de tributos.
O Fisco tem cinco anos para validar o pedido, mas a compensação é feita em dias e a companhia já pode aproveitar os valores como moeda para reduzir o tributo a pagar. Algumas empresas já começaram a ser fiscalizadas pela Receita, o que motivou a publicação, na última semana, da Instrução Normativa nº 2288, que restringe as “compensações predatórias”.
O perigo, de acordo com especialistas, está no longo prazo, pois a jurisprudência – e, agora, a Receita – tem afastado a legitimidade das entidades sem estatuto social definido. Para o Judiciário e Fisco, associações que não representam um setor específico não podem atuar como substitutos processuais. Casos como o da Associação Brasileira dos Contribuintes Tributários (ABCT), da Associação Nacional dos Contribuintes de Tributos (ANCT) e da Associação Comercial e Industrial de Americana (ACIA).
A ACIA tem, inclusive, vídeo no Youtube e página no site dedicada a captar associados para a tese do século. Diz que a decisão obtida na ação coletiva, protocolada em 2008, é “irreversível”, o que garante segurança jurídica, dinheiro no fluxo de caixa da empresa e “vantagem competitiva”. “A cada cinco anos, uma empresa de lucro real [faturamento acima de R$ 78 milhões] poderá recuperar o equivalente a até um faturamento por mês. Participando da ação coletiva da ACIA, poderá recuperar até três faturamentos mensais, porque são 15 anos a restituir”, diz o site.
A 2ª Turma do STF, em agosto, impediu a Tabatex, de tecnologia têxtil, de executar decisão da ACIA, sobre a tese do século. O relator, ministro Dias Toffoli, citou precedente da Corte de 2021 que entendeu ser desnecessária a filiação prévia a uma associação para a cobrança de valores pretéritos decorrente de mandado de segurança coletivo.
Nesse julgado, que analisou a filiação tardia de policiais militares, os ministros disseram que a tese não valeria para questões tributárias (Tema 1119). Mas algumas associações viram a decisão como brecha. Toffoli, porém, no caso da ACIA, disse que o tema “não se aplica às associações genéricas, como a agravante, que não representa qualquer categoria econômica ou profissional específica” (ARE 1556474). A 2ª Turma do STF já reconheceu a ilegitimidade da ABCT, em 2022 (ARE 1339496).
Tribunais Regionais Federais têm decidido da mesma forma. O TRF-3, no ano passado, declarou a ANCT ilegítima em ação do Sistema S (processo nº 5020024-11.2019.4. 03.6100). O TRF-1 deu decisão em igual sentido sobre a mesma associação. Exigiu a relação nominal dos associados, com autorização expressa, bem como comprovação de filiação prévia (processo nº 1011140-50.2022.4.01.3307).
O advogado da Tabatex afirma que o STF está alterando a coisa julgada. “No mandado de segurança coletivo, já foi analisada a questão de legitimidade e houve o trânsito em julgado sem nenhum tipo de limite, ou territorial, ou temporal”, diz ele, que não recorreu por não ver possibilidade de reversão.
Segundo ele, a ACIA, entidade para a qual já atuou, não é genérica, como a ANCT e ABCT. “O estatuto dela tem todos os objetos que ela tem a perseguir, que é o desenvolvimento econômico da região. Ou seja, ela precisa de maior número de empresas associadas para poder ter o benefício econômico pretendido”, afirma.
O advogado se diz surpreso com o acórdão do STF. “O Judiciário reclama constantemente do excesso de demanda judicial, mas quando se impede o mandado de segurança coletivo, que vai agregar várias empresas e evitar essas empresas de judicializarem a questão, ele dá uma decisão dessa, que diminui o direito coletivo”, completa.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), em nota ao Valor, diz que a decisão do STF, no caso da Tabatex, aplicou corretamente o precedente do Tema 1119. “A PGFN tem conhecimento de que diversas associações genéricas vêm ofertando no mercado propostas como as da ACIA”, afirma. O órgão diz ainda acreditar “que a pretensão dessas associações genéricas e de todos os contribuintes que se filiaram a elas depois da impetração serão rejeitadas pelo judiciário, como já vêm fazendo os TRFs e o próprio STF”.
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal Valor Econômico






