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15 de Setembro de 2025A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que a taxa básica de juros, a Selic, deve ser o índice de correção para dívidas civis e indenizações. O julgamento foi unânime e terminou à meia-noite desta sexta-feira, no Plenário Virtual. Prevaleceu o voto do relator, ministro André Mendonça. A decisão afeta cerca de seis milhões de processos no país, segundo informou o Superior Tribunal de Justiça (STJ) quando julgou o tema no ano passado.
A discussão impacta todas as relações de direito privado, como obrigações previstas em contrato de prestação de serviço, empréstimo ou casos que envolvem direito do consumidor e inadimplência — falta de pagamento de conta de água ou energia, cartão de crédito, atraso de voo e situações extracontratuais.
Segundo advogados, a questão ficou pacificada a partir de 2024, com a Lei nº 14.905, que mudou o Código Civil. A legislação estabeleceu novas regras para a atualização monetária e a aplicação de juros em casos de inadimplência — devem ser aplicados, respectivamente, IPCA e Selic. Para o cálculo dos juros, deverá ser deduzida a atualização monetária. Se a diferença entre esses valores for negativa, a taxa de juros considerada será zero para o período de referência.
A discussão foi levada ao Supremo depois de a Corte Especial do STJ decidir pela adoção da Selic. O julgamento, na ocasião, foi apertado, com diferença de um voto. O relator, ministro Luis Felipe Salomão, ficou vencido. Como o STF reafirmou o precedente, alguns especialistas dizem que houve harmonização dos entendimentos — entre as decisões dos tribunais superiores e a nova lei. Essa compreensão, todavia, não é unânime.
Os devedores saem vitoriosos com a decisão. Eles defendem a aplicação da Selic, pois, na prática, o valor da dívida fica menor se comparado à taxa de 12% ao ano e correção monetária que era usada pelos tribunais — cada um tinha sua regra e, em maioria, era aplicado o IPCA. Hoje, os percentuais estão próximos. Porém, a Selic já esteve mais baixa, chegando a 2% no período da pandemia da covid-19.
Segundo o advogado que representa a credora no caso, aplicar a Selic reduz, em média, 30% do valor da indenização a ser recebida. No processo em análise, se aplicada a taxa básica, o valor da dívida de R$ 20 mil iria para R$ 37 mil. Se utilizada a taxa de 12% ao ano somada à correção monetária, seria de cerca de R$ 51 mil.
Seis entidades estão como partes interessadas (amicus curiae). Entre elas, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e a Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNseg), que defendem a aplicação da Selic. Já o Instituto de Defesa de Consumidores (Idec) e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) são contra.
No voto, o ministro André Mendonça diz inicialmente que não seria possível julgar o caso por questões processuais — seria necessário análise de lei infraconstitucional, o que é vedado pelo Supremo. Mas acrescenta que a jurisprudência do STF já reconhece a validade da taxa Selic como índice de correção monetária para atualizar condenações cíveis.
“Ainda que fosse possível superar o óbice acima apontado, melhor sorte não teria a recorrente. Isso porque a jurisprudência do Supremo Tribunal tem reconhecido a validade da Taxa Selic como índice de correção monetária e de juros moratórios e, ainda, a sua incidência para atualização de condenações cíveis em geral”, diz Mendonça, citando precedente de 2021 em que a taxa foi aplicada em condenação judicial e aos depósitos recursais na Justiça do Trabalho (ADC 58).
O ministro também reafirma o julgamento do STJ. A discussão se baseou na aplicação do artigo 406 do Código Civil. O dispositivo determina que os juros moratórios, quando não estabelecidos em contrato, serão fixados pela taxa que estiver em vigor para o pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. Defensores dos credores dizem que se aplicaria, então, o artigo 161 do Código Tributário Nacional (CTN), que determina a aplicação de juros de mora de 1% ao mês.
O caso analisado (RE 1558191) envolve condenação da empresa de transporte Expresso Itamarati, obrigada a indenizar uma passageira. O motorista passou por uma lombada em alta velocidade e a passageira foi arremessada para o alto. Ela sofreu lesões que resultaram na invalidez para o trabalho que exercia, o de prestação de serviços domésticos.
O acidente ocorreu em março de 2013. Em 2016, veio a sentença que condenou a empresa a pagar a indenização por dano moral em R$ 20 mil. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) aplicou juros de mora de 1% ao mês a partir da data em que a empresa foi citada (novembro de 2014) e de correção monetária a contar da sentença (outubro de 2016).
A Expresso Itamarati reverteu o acórdão de segunda instância no STJ. Em seguida, a passageira recorreu ao Supremo. O advogado dela diz agora que vai recorrer para que seja, pelo menos, aplicada a modulação dos efeitos — restringir a aplicação da decisão para frente, como foi feito para correção de dívidas trabalhistas (ADC 58). Defende que a jurisprudência majoritária sempre foi contra a aplicação da Selic. “Todos os tribunais do Brasil, desde o Código Civil de 2002, aplicavam os juros de 12% e correção monetária. Não se tinha divergência.”
Segundo ele, quando a Selic foi para 2% em 2020, as empresas devedoras “ressuscitaram” um acórdão do ex-ministro Teori Zavascki que defendia a Selic. “Criaram a narrativa de que haveria jurisprudência dominante, mas é o oposto”, afirma. “Está se estimulando um calote, porque devedores estão usando o Judiciário e ganhando dinheiro.”
O advogado que representa a CNSeg, defende que já havia jurisprudência favorável à Selic. “A decisão cria uma harmonia porque o STF já decidiu que se aplica a Selic para dívidas tributárias e trabalhistas”, diz ele, citando julgamentos como o da ADC 58 e o da ADI 5867.
A taxa Selic, acrescenta, flutua de acordo com questões macroeconômicas. “Então é suficiente para fazer essa correção”, afirma. Aplicar a taxa de 12% mais correção seria ir contra o artigo 944 do Código Civil, segundo o advogado. O dispositivo estabelece que a indenização se mede pela extensão do dano. “A indenização não pode significar lucro”, defende.
Em nota, a Febraban diz que aplicar a Selic “confere previsibilidade e estabilidade da aplicação das normas jurídicas públicas e privadas, prestigiando a segurança jurídica”.
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal Valor Econômico






