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8 de Maio de 2023Com base no Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a 3ª Turma do TRT da Bahia (TRT-5) condenou uma loja do ramo de equipamentos de academia de Salvador a indenizar, por danos morais, uma vendedora vítima de assédio sexual por parte de colegas e do superior hierárquico. A decisão, que estabeleceu o valor de R$ 60.759,64 para a indenização, reformou a sentença de 1º Grau. O processo corre em segredo de justiça, e ainda cabe recurso.
A trabalhadora sustentou que alguns colegas e a chefia tinham condutas prematuras e de conotações sexuais. Um vendedor teria apalpado seus seios, e chegou a abaixar as calças na sua frente. Ela também alegou que assistiam vídeos pornográficos na sua presença e era chamada de termos ofensivos machistas. Segundo consta nos autos, os sorrateiros avanços nas condutas levaram a vítima a viver um verdadeiro calvário e, por conta dos acontecimentos, seu relacionamento amoroso foi ao fim e nunca mais recuperou seu estado emocional.
O relator do acórdão, desembargador Luiz Tadeu Vieira, destacou que a desigualdade nas relações entre gêneros é um fenômeno social que vem originando reflexão no âmbito acadêmico, jurídico e na sociedade civil, com reflexo mesmo na legislação. Também, que há um olhar mais cuidado às formas de violência historicamente silenciosas e naturalizadas. “Atento ao fato, o CNJ publicou no ano de 2021 o Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, que orienta magistrados e magistrados a julgarem, nos casos concretos, sob a lente de gênero, avançando na efetivação da igualdade e nas políticas de equidade” , explicou.
Em sua decisão, o desembargador expressou que o julgamento do caso a partir da perspectiva de gênero refletiu sobre a culpabilização da vítima, sobre as razões do silenciamento e da acusação tardia. Ainda segundo ele, após atenta leitura dos autos, tratou-se que “ao contrário do que concluiu a primeira instância, a funcionária não demonstrou conivência com o ambiente degradado”. O relator salientou que as respostas da vendedora “meninooooo” e “meu pai do céu”, no grupo da empresa num aplicativo de mensagens, após um colega falar “gostosa, vá dormir e sonhar com seu gatinho”, impor o constrangimento ao qual era diuturnamente sozinho, e não tolerância com a situação. “Ainda, o só fato de se usar de apelidos para se referir ao chefe e aos colegas de trabalho,
“Note-se nas muitas conversas juntas ao processo que a funcionária em nenhum momento deu margem às brincadeiras alegadas, mostrando-se sempre envergonhada ou apresentando leves reprimendas à conduta dos seus colegas homens”, afirmou o relator. Ele ainda frisou: “Ter participado de festa de aniversário ou confraternização junto com a equipe em nada fraqueza a narrativa contida na petição inicial, que se mostrou verossímil a partir das provas, tanto documental como testemunhal, produzidas no curso da instrução processual”.
O relator também introduziu que, conforme alerta o Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, o silenciamento de vozes dentro da organização pode levar à situação em que a violação reiterada faz com que a vítima se sinta impotente para reagir ou procurar algum tipo de ajuda. “Assim, a falta de reação imediata da vítima ou a demora em denunciar a violência ou o assédio não deve ser interpretada como aceitação ou concordância com a situação”, entendeu o desembargador. Ainda de acordo com ele, a própria intersecção de classe e gênero, que é frequente em situações de violência ou de assédio nas relações de trabalho, aponta para uma maior vulnerabilidade da vítima, que pode perceber qualquer insurgência de sua parte como motivo para perder o emprego.
Os desembargadores da 3ª Turma, no presente caso, entenderam que é inegável o dano moral sofrido, sob todos os aspectos analisados: por agressão sexual perpetrada pelos pressupostos da empresa e pela humilhação sofrida. “Mais que isso, configura-se conduta de conotação sexual praticada contra a vontade de alguém, sob forma verbal, não verbal ou física, manifestada por palavras, gestos, contatos físicos ou outros meios, com o efeito de perturbar ou estranhar a pessoa, afetando a sua diminuição, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador; o que é suficiente para caracterizar a ocorrência de assédio sexual”, reiterou o relator Luiz Tadeu Vieira.
Subordinação no dano moral
Também na visão da 3ª Turma, a despeito de o crime de assédio sexual prever a existência de subordinação, para configuração do dano moral basta que seja demonstrada a prática de um ato ilícito (fato lesivo) omissivo ou comissivo por parte de preposto da empresa, ainda que de mesmo nível hierárquico, a lesão moral efetivamente sofrida pelo empregado (dano) e a relação direta entre o ato ilícito e o dano (nexo de causalidade).
Quanto à horizontalidade da conduta, o magistrado destacou que “o que importa para configurar o assédio não é o nível hierárquico do assediador ou do assediado, mas sim as características da conduta: a prática de situações de conotação sexual contra a vontade de alguém, sob forma verbal, não verbal ou física, manifestada por palavras, gestos, contatos físicos ou outros meios, com o efeito de perturbar ou estranhar a pessoa, afeta a sua dignidade, ou de lhe cria um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador no ambiente de trabalho, de forma reiterada”.
Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região