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18 de Novembro de 2022Empresas que atuam com exportação e têm a carga roubada no trajeto para o porto ou o aeroporto ou mesmo no ambiente alfandegário, além da perda financeira, precisam lidar com os efeitos tributários do crime. Estados e União exigem o pagamento de impostos que estão atrelados às mercadorias roubadas.
A exportação garante isenções fiscais. Está na Constituição Federal. Só que como não há, nesses casos, a confirmação do envio da carga para fora do país, a administração pública considera que o benefício deixa de existir. Por isso, as cobranças.
Mas as companhias vêm recorrendo à Justiça e têm conseguido decisões favoráveis. Há casos recentes na Justiça do Estado de São Paulo e também no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), que julga conflitos envolvendo a União em São Paulo e Mato Grosso do Sul.
A decisão da Justiça de São Paulo beneficia uma trading de commodities. A empresa celebrou contrato de exportação de café. Mas no trajeto para o porto, o caminhão foi interceptado por criminosos, o motorista ameaçado e a carga roubada.
A empresa registrou boletim de ocorrência e recebeu indenização da seguradora, o que minimizou a perda financeira. Tempos depois, no entanto, foi surpreendida pelo Estado de São Paulo com uma fatura de R$ 170 mil de ICMS.
Para evitar a lavratura de auto de infração e aplicação de multa, optou por pagar o imposto. Em seguida recorreu à Justiça e obteve o direito à restituição. A decisão foi proferida pela 15ª Vara de Fazenda Pública da Capital.
Também neste ano, pouco antes, o TRF-3 já havia proferido decisão parecida num caso envolvendo a União. Os desembargadores se debruçaram sobre o maior roubo de ouro da história do país.
Três empresas vítimas do crime recorreram à Justiça para não perder benefícios fiscais atrelados à venda da mercadoria.
O crime aconteceu no terminal de cargas do aeroporto de Guarulhos há cerca de três anos. Oito homens com roupas de policiais e distintivos entraram no local e, em menos de três minutos, carregaram mais de 700 quilos de ouro prestes a ser exportados.
A exportação confirmaria o benefício fiscal. Só que como houve o roubo, a operação não foi concluída. A Receita Federal entendeu pela perda do benefício e vinha cobrando os tributos que, sem o direito à isenção, acabaram ficando descobertos.
Esse entendimento foi chancelado em primeira instância, mas as empresas recorreram e conseguiram reverter no tribunal. Os desembargadores da 6ª Turma decidiram, de forma unânime, por manter o benefício fiscal.
Estava em discussão, nesse caso, o regime chamado “drawback”. Essa sistemática suspende, temporariamente, os tributos sobre a importação de insumos usados na produção de mercadorias destinadas à exportação.
Porém, se a venda não é realizada no prazo de até dois anos (um ano prorrogável por mais um), o exportador é obrigado, pela legislação, a recolher os impostos suspensos. Com encargos.
Para os desembargadores da 6ª Turma do TRF-3, no entanto, o caso do roubo tem especificidades. “A obrigação de exportar não se cumpriu por motivo não atribuível aos exportadores, que teriam esgotado sua atuação no processo de exportação”, consta na decisão (processo nº 5003293-43.2020.4.03.6119).
No caso relativo ao Estado de São Paulo, a discussão é um pouco diferente. A Fazenda Pública alegou, na ação judicial, que o fato gerador do ICMS é a saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte.
Para o juiz Kenichi Koyama, da 15ª Vara de Fazenda Pública, que julgou esse caso, no entanto, não funciona dessa forma. Ele afirma, na decisão, que não é a saída da mercadoria do estabelecimento que configura fato gerador de ICMS, mas a mudança de titularidade do bem e cita que há jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) nesse sentido.
“Sendo assim, a ocorrência do fato gerador do ICMS não se realiza nos casos de roubo ou furto da mercadoria, antes de sua entrega ao adquirente, uma vez que não concretizada a operação mercantil”, frisa.
O juiz também usou como base para a sua decisão jurisprudência firmada no STJ sobre cobranças de IPI. Em julgamento realizado no ano de 2018, a 1ª Seção – que uniformiza o entendimento a ser adotado nas turmas que julgam as questões tributárias na Corte – decidiu contra a incidência do imposto sobre mercadoria roubada no trajeto entre o estabelecimento industrial e o destino de venda.
A decisão, dada em processo da Philip Morris Brasil, foi unânime e confirmou o entendimento adotado nas turmas desde o ano de 2012 (ED 734.403).
“O precedente, embora trate de IPI, aplica-se ao caso por seguir a mesma lógica. O fato gerador do IPI, assim como do ICMS, não é a saída do produto do estabelecimento industrial, mas a efetiva conclusão da operação mercantil, consistente na entrega do produto ao comprador”, afirma o juiz Kenichi Koyama (processo nº 1041240-21.2022.8.26.0053).
Em nota, a Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo informa que a cobrança do tributo tem previsão na Lei Estadual do ICMS e também no Convênio ICMS nº 84, editado no ano de 2009 pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Afirma ainda que interpôs apelação contra a sentença e o recurso está pendente de julgamento no TJSP.
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal Valor Econômico