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1 de Fevereiro de 2024A iFood Benefícios, Caju, Flash e Swile – startups de cartões de benefícios flexíveis – foram condenadas no Judiciário a pagar indenização à Associação Brasileira das Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT), que reúne entre as 16 associadas Sodexo, Alelo e Ticket, por prática de concorrência desleal. Cabe recurso.
A sentença foi proferida pelo juiz André Salomon Tudisco, da 1ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem de São Paulo. Ela é relevante porque a disputa no setor é acirrada, principalmente entre startups e as grandes tradicionais. O mercado de benefícios de vale-alimentação e refeição movimenta cerca de R$ 150 bilhões por ano.
Na ação judicial, a ABBT alega que as startups atuaram de forma ilegal no Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). Teriam usado o chamado “arranjo aberto” de pagamento antes do prazo estabelecido pelo Decreto nº 10.854, de 2021 – dia 11 de maio de 2023.
O arranjo aberto, usado pelas startups, é aquele em que existe uma empresa instituidora do arranjo (a “bandeira”), outra que emite o cartão (como um banco) e uma terceira que credencia os estabelecimentos para aceitar esse meio de pagamento (por exemplo, as maquininhas). Assim, o usuário não precisa perguntar se o restaurante aceita determinado cartão, porque em geral é da bandeira Visa ou Mastercard, que se aceita em todo lugar.
Até 11 de maio de 2023, segundo a ABBT, era permitido apenas o chamado “arranjo fechado”. Nesse caso, o cartão é emitido por um determinado estabelecimento (como uma loja ou um supermercado), não possui bandeira e só pode ser usado nessa loja ou em parceiros específicos – uma rede fechada.
Por isso, na ação, a ABBT argumenta que as startups praticaram concorrência desleal e pede indenização por danos morais e materiais. A base legal é o artigo 195 da Lei de Propriedade Intelectual (nº 9.279, de 1996).
Já as startups alegam, no processo, que não há qualquer vedação legal para a realização da operação pelo “arranjo aberto” antes do prazo apontado.
Na decisão, o juiz Andre Salomon Tudisco destaca que o PAT, criado pela Lei nº 6.321, de 1976, tem como objetivo a “melhoria da situação nutricional dos trabalhadores, visando a promover sua saúde e prevenir as doenças profissionais”. E que, para isso, permitiu-se a dedução, do lucro tributável para fins de imposto sobre a renda das pessoas jurídicas, do dobro das despesas realizadas em programas de alimentação do trabalhador. Mas, para ter direito à dedução, diz ele, as empresas precisam preencher determinados requisitos da lei.
Especificamente sobre o decreto que, em 2021, alterou a Lei do PAT, o magistrado declara que o artigo 188, inciso I, alínea “a”, dá o prazo de 180 dias para o uso do arranjo aberto. “até decurso do prazo de vacatio legis, a execução do PAT somente estava autorizada pelo arranjo de pagamento fechado”.
Para Tudisco, essas empresas que usaram o arranjo aberto “empregaram meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem”, nos termos do artigo 195, inciso III, da Lei de Propriedade Industrial.
Ele ainda esclarece que as startups não estavam impedidas do exercício de suas atividades, “pois poderiam ofertar cartões de alimentação ou refeição pelo arranjo de pagamento aberto, desde que fora o regime do PAT”.
Quanto aos prejuízos sofridos pelas associadas da ABBT afirma que “são incontestáveis, pois aqueles que contrataram as requeridas, para utilização de cartões alimentação ou refeição, por meio de arranjo de pagamento aberto, sob o regime do PAT, seriam prováveis clientes”. O valor da indenização não foi definido.
De acordo com o advogado que assessora a ABBT no processo, a sentença coloca os players do mercado em igualdade de condições. “O Judiciário reconheceu que o ato das startups foi ilegal e prejudicou as associadas da ABBT”, diz.
As startups, segundo o advogado, praticaram concorrência desleal porque “ofertaram aos clientes deles benefícios que não eram permitidos por lei, enquanto as associadas da ABBT continuavam atuando nos limites legais”.
A decisão é importante, de acordo com o advogado “ao dar um recado para o setor: a disputa por clientes tem de ser feita dentro dos limites legais, para que tenhamos um ambiente concorrencial saudável”.
Por meio de nota ao Valor, o iFood Benefícios informa que recorrerá da decisão. Diz também que ela “não tem nenhum impacto aos clientes do iFood Benefícios”. A empresa ainda destaca que tem cadastro no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) para atuar no PAT desde 2019, “o que demonstra que a empresa sempre cumpriu todos os requisitos legais previstos no programa”.
A Flash também deve recorrer da decisão. Segundo Ademar Bandeira, Chief Financial Officer, e Pedro Lane, Chief Operating Officer da startup, a empresa tem autorização concedida pelo Ministério do Trabalho para atuar no PAT desde 2019, com esse modelo de negócio, e em nenhum momento sofreu processo administrativo ou foi questionada pelo órgão sobre o uso do arranjo aberto.
Para Lane, a decisão deve ser revertida no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), até porque determinou pagamento de indenização por concorrência desleal a uma associação, “o que não faz muito sentido”. Ele destaca que não daria para falar em prejuízo à concorrência porque a ABBT é formada por operadoras de benefícios que detém 90% de market share.
Por meio de nota, a empresa ainda destaca que “a decisão não afeta a nossa operação e não proíbe a utilização dos cartões de benefícios flexíveis – que segue expressamente autorizada e em conformidade legal, sem qualquer impacto para clientes e trabalhadores vinculados ao PAT”.
A Caju informa, também por nota ao Valor que irá recorrer. Afirma que “sequer oferecia benefícios no PAT à época”. A startup teria passado a operar no PAT a partir de maio de 2023, “de modo que não há o que se falar em concorrência desleal”. Na nota diz ainda que “segurança jurídica sempre foi um dos nossos pilares e nenhuma empresa cliente da Caju corre o risco de ser prejudicada pela decisão.”
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal Valor Econômico