STJ: vendedor é responsável solidário pelo IPVA apenas mediante lei estadual
29 de Novembro de 2022STF valida leis que restringem aproveitamento de créditos de PIS/Cofins
30 de Novembro de 2022Há cerca de 20 anos, com a entrada em vigor do então novo Código Civil (Lei nº 10.406/2002), publicávamos um artigo dizendo que o sócio de uma limitada tinha ido dormir controlador e havia acordado, no dia seguinte, sem o controle da sociedade.
Desde 1919 e até aquela data, o Decreto nº 3.708 era o diploma legal que regulava as limitadas. E tal decreto, com pouquíssimos artigos, determinava que, se o contrato não previsse quórum especial, as deliberações sociais seriam tomadas por maioria absoluta de votos em relação ao capital social, aplicando-se a regra geral prevista na lei das sociedades por ações, equivalente a mais de 50% do capital votante.
Sem maiores alardes, a Lei nº 14.451/2022 reduziu alguns importantes quóruns de deliberações em sociedades limitadas
O diploma de 2002 passou a prever para as sociedades limitadas quóruns mínimos para certas matérias, independentemente da vontade dos sócios, visto que, para as mais importantes deliberações societárias (como alteração do contrato social, incorporação, cisão, fusão, dissolução da sociedade e cessação do estado de liquidação), o quórum mínimo legal passou a ser de 75% do capital social. Até mesmo um quórum de unanimidade foi previsto para aprovação de designação de administradores não sócios, enquanto o capital social não estivesse integralizado. É por isso que se afirma que o Código Civil de 2002 mudou o conceito de controle societário para as limitadas até muito recentemente.
E isso trouxe implicações de várias ordens. Tomemos alguns exemplos. Supondo-se um sócio que houvera adquirido o controle de uma limitada por compra em 2001, de quotas representando 51% do capital social, e pago o preço por esse controle: perdeu-o do dia para a noite. Um casal detentor de uma limitada, casado pelo regime da comunhão parcial e tendo constituído a empresa na constância do casamento, que lhe gerou 5 filhos: se um dos cônjuges falece sem testamento, o sobrevivente passa a deter 50% da empresa; até 2003 ele precisaria de um de seus filhos para fazer a maioria; com a entrada em vigor do Código Civil ele passou a depender de três dos filhos para as deliberações mais importantes. Um outro reflexo: uma família de três irmãos, sócios de uma limitada. Até 2003, deliberando por maioria, onde dois decidissem, o terceiro era voto vencido. A partir de 2003 essa sociedade passou a depender, na prática, da unanimidade de seus sócios para atingir o quórum de 75%.
Tanto isso é fato que, por vezes, ao longo dos últimos 20 anos, em operações para a implementação de planejamentos sucessórios passou a ser primordial a previsão, em acordo de sócios, da obrigatoriedade de transformação do tipo de uma sociedade limitada em S.A., a fim de assegurar o controle societário para determinado sócio ou grupo de sócios. A elaboração de competente acordo passou a ser medida medular a garantir o controle no capítulo destinado ao voto.
Em outras situações, a criação de holdings para titular as participações societárias passou a ser imprescindível, de forma a permitir a concentração dos votos equivalentes a 75% do capital social pela controladora, e com isso, determinar que as orientações de voto da holding nas reuniões da sociedade controlada pudessem ser aprovadas pela maioria do capital. Uma estrutura complexa e burocrática e, em muitos casos, tributariamente ineficiente, acabava sendo a opção menos desejada, porém necessária para a garantia de manutenção do controle societário absoluto.
Entretanto, sem maiores alardes e após uma longa espera de 20 anos, em 22 de setembro foi publicada a Lei nº 14.451/2022, que alterou os artigos 1.061 e 1.076 do Código Civil, reduzindo alguns importantes quóruns de deliberações em sociedades limitadas e, viajando no tempo, voltando à realidade de 20 anos atrás.
Sim! Após 20 anos de espera, as deliberações para alterar o contrato social, ou implementar operações societárias de incorporação, fusão e dissolução da sociedade, bem como cessação do estado de liquidação, não precisam mais ser aprovadas por sócios representando três quartos ou 75% do capital social. Passam agora – ou voltam agora – a depender apenas de votos correspondentes a mais da metade do capital social.
Essas modificações legislativas estavam sendo aguardadas pelo meio jurídico, que jamais entendeu o fundamento para a criação de tantos quóruns qualificados, sem qualquer justificativa para tal.
Mas a boa nova é a seguinte: os tempos de controle societário das limitadas por 75% do capital ficaram no passado e a nova alteração legislativa vem simplificar a condução dos negócios de sociedades limitadas e aproximá-las, novamente, com relação aos seus quóruns, aos das sociedades anônimas.
Vale, entretanto um alerta importante: durante essas duas décadas, os sócios das limitadas foram se adaptando à estrutura de controle por 75% do capital para as grandes decisões, e, em alguns, casos, até garantindo maior segurança em relação a determinadas modificações sociais.
Por isso é que se faz relevante que os contratos sociais sejam revistos, tendo em vista que as alterações entraram em vigor no dia 22 de outubro para todas as sociedades limitadas, já constituídas ou não. A verificação deve focar em eventual adequação do texto contratual à nova legislação, mediante a simplificação da previsão das deliberações societárias, de forma que sejam aprovadas pela maioria do capital social, ou para, eventualmente, garantir contratualmente o quórum de 75%, agora já na qualidade de quórum qualificado e não mais de quórum legal, caso seja do interesse dos sócios.
Informações publicadas pelo jornal Valor Econômico.
Equipe Marcelo Morais Advogados