Decisões recentes da Justiça do Trabalho têm remetido processos sobre pejotização para a Justiça comum. Os magistrados têm fundamentado o entendimento nas reclamações julgadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – que admitem várias formas de contratação – e em julgamento de fevereiro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A decisão estabelece que a Justiça comum deve analisar a alegação de fraude em contratos de prestação de serviço.
Nessas situações, a Justiça comum checa se há a existência de ilegalidade no contrato e somente se houver fraude, algum vício de consentimento, o processo será remetido à Justiça do Trabalho para se verificar a existência do vínculo de emprego.
Já existe posicionamento nesse sentido em pelo menos cinco Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs): de São Paulo, Campinas e região (interior paulista), Paraná, Minas Gerais e Alagoas.
Algumas dessas decisões citam julgamento da ministra do STJ Nancy Andrighi. A magistrada analisou o pedido de vínculo empregatício de uma contratada autônoma com uma empresa de comércio e locação de contêineres. A contratada alegava existir fraude em sua contratação como autônoma e pedia uma indenização no valor de R$ 80 mil em razão de um acidente de trabalho sofrido.
Segundo a ministra, não é possível analisar o pedido de vínculo de emprego e de indenização por acidente de trabalho sem antes verificar a validade do contrato de prestação de serviços. “A causa de pedir está lastreada fundamentalmente na existência de má-fé da empresa na entabulação do contrato originário, de modo que é inviável decidir o pleito principal de reconhecimento de vínculo empregatício sem se imiscuir na causa de pedir deduzida na ação (alegação de fraude)”, escreveu.
Nancy reconheceu a competência da Justiça comum estadual para julgar a demanda. Segundo a decisão, só após reconhecimento de “eventual vício de consentimento ou social, com anulação do negócio jurídico preexistente” seria possível pleitear na Justiça do Trabalho o reconhecimento do suposto vínculo de emprego (conflito de competência Nº 202726 – SP).
Com base nesse julgamento, a 9ª Turma do TRT de São Paulo, determinou, por maioria, que uma discussão entre uma trabalhadora e uma empresa de educação fosse encaminhada à Justiça comum. No caso, a trabalhadora apresentou recibos de pagamento que seriam relativos a serviços esporádicos. O relator, desembargador Sérgio José Bueno Junqueira Machado, citou a decisão da ministra Nancy e declarou de ofício a incompetência da Justiça do Trabalho para julgar o processo.
Entendeu que “apenas após reconhecido eventual vício de consentimento ou social, com a consequente anulação do negócio jurídico preexistente, é que haverá a possibilidade de se pleitear, perante a Justiça do Trabalho, o reconhecimento do alegado vínculo empregatício” (processo nº 1001640-42.2022.5.02.0075).
A 4ª Turma do TRT de Minas Gerais também deu decisão unânime, em abril, para reconhecer de ofício a incompetência da Justiça do Trabalho para analisar pedido de vínculo empregatício de uma prestadora de serviços médicos com uma clínica (processo nº 0011301-72.2022.5.03.0095).
O relator, desembargador Delane Marcolino Ferreira, também citou decisão da ministra Nancy Andrighi. Para ele, “é inviável decidir o pleito principal de reconhecimento de vínculo empregatício sem se imiscuir na causa de pedir deduzida na ação [alegação de fraude].”
Os desembargadores também remetem os processos para a Justiça comum com base no entendimento firmado nas reclamações julgadas pelo Supremo. É o caso, por exemplo, de julgamento unânime, ocorrido na 10ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, com sede em Campinas.
O relator, desembargador Ricardo Laraia, ao analisar o pedido de vínculo de uma prestadora de serviços com um banco, destacou que a maioria dos ministros do STF, com exceção de Flavio Dino e Edson Fachin, já têm entendimento firmado de que esses casos devem ser remetidos para a Justiça comum.
De acordo com a decisão, “somente se a Justiça Estadual decidir que a fraude ocorreu, é que cabe à Justiça do Trabalho examinar o pedido de declaração da existência da relação de emprego” (processo nº 0010322-81.2021.5.15.0008).
Equipe Marcelo Morais Advogados
*Com informações publicadas pelo jornal Valor Econômico