Empresa de publicidade e marketing é condenada a pagar indenização por danos morais por atos obscenos praticados pelo gerente da empresa
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25 de Maio de 2022A juíza Renata Lopes Vale, titular da 40ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, reconheceu o vínculo de emprego entre um trabalhador e um aplicativo de entrega de refeições, no período de 8/3/2019 a 8/7/2021, na função de motofretista e sob a modalidade de contrato de trabalho intermitente. Na decisão, a magistrada rejeitou o argumento da defesa de que a dispensa teria sido por justa causa diante “do excesso de cancelamentos após o aceite da entrega”. Segundo o entendimento adotado, não houve prova de que pedidos teriam sido cancelados por culpa do entregador.
Com base nesse contexto, a empresa foi condenada a pagar aviso-prévio, 13º salário, férias mais um terço e FGTS com multa de 40%, relativos ao período reconhecido. Por descumprir o prazo previsto na lei para pagamento do acerto rescisório, a reclamada foi condenada ainda a pagar multa no valor de um salário mensal do autor, conforme previsto no artigo 477, parágrafo 8º, da CLT. Foi determinado que as verbas sejam apuradas tendo em conta a média mensal de pagamentos ao profissional.
Ao fundamentar a decisão, a julgadora avaliou que: “Em que pese o esforço empresário em contestação, a conclusão é de que o que a plataforma oferece ao usuário final, através de processamento de dados e do trabalho do motorista, é o serviço de entrega de refeições, sendo o aplicativo um meio para a realização desse serviço. O usuário final não pode, por meio da ré, escolher qual motoqueiro fará a entrega da refeição. O valor da corrida é calculado automaticamente pela empesa, não podendo ser negociado diretamente com o entregador. É dizer, o usuário final contrata o serviço de entrega da plataforma, e não o motorista”.
A juíza identificou, ainda, a presença dos pressupostos necessários para a configuração da relação empregatícia, quais sejam, onerosidade, pessoalidade, não eventualidade e subordinação jurídica. Pelas provas, constatou que os serviços eram remunerados, havia exigência contratual de que o perfil fosse de uso exclusivo do entregador e os serviços eram prestados de forma contínua em atividade imprescindível à atividade-fim do empreendimento da plataforma.
Com relação à subordinação jurídica, foi pontuado que, atualmente, não é necessária a presença física de fiscalização, tendo em vista os meios telemáticos necessários para tanto. A existência da subordinação foi extraída do próprio depoimento do representante da empresa, que assim declarou: “o entregador teve o contrato rescindido por falta de entrega dos pedidos; que, ao que consta no sistema, o cliente fez o pedido e o motofretista não fez a entrega; que antes do bloqueio é possível contestar; que, para realizar o bloqueio, são necessárias várias ocorrências, não somente uma; que, no caso, não sabe precisar o número de ocorrências, sendo que a média do aplicativo são três, (…) que o aplicativo tem o controle das entregas realizadas pelo motofretista”.
O reconhecimento do contrato de trabalho também se baseou nos termos de prestação de serviços constantes dos “Termos e Condições de Uso”. Dentre as características da prestação de serviços, o documento cita as condições indispensáveis para tanto, as obrigações do entregador, o percentual a ser retido pela empresa, o preço a ser praticado e as punições em caso de não atendimento às condições contratuais. Para a julgadora, ficou evidente que “os riscos da atividade foram ilegalmente transferidos ao trabalhador, com patente violação do artigo 2º da CLT”.
Modalidade de dispensa
Em defesa, a reclamada sustentou que a dispensa teria ocorrido por justo motivo, por violação aos termos de uso. É que teria havido excesso de cancelamentos após o aceite da entrega. Entretanto, a juíza considerou que essa versão não foi provada pela empresa. Além da impugnação do relatório apresentado, não houve comprovação de que os pedidos teriam sido cancelados por culpa do entregador. A decisão reconheceu a dispensa sem justa causa, no dia 8 de julho de 2021.
Fundamentos – relação de emprego
Na decisão, a julgadora discorreu sobre diferença essencial entre o contrato de emprego e os contratos de direito civil. “Nestes, a produção dos efeitos jurídicos e a aplicação do direito somente dependem do acordo de vontades, enquanto no de emprego é necessário o cumprimento mesmo da obrigação contraída”, registrou. Daí poder se deduzir, segundo a juíza, que, no direito civil, o contrato não está ligado a seu cumprimento, enquanto no de emprego não fica completo senão através de sua execução.
Em outras palavras: “O contrato de emprego somente fica completo pelo fato real de seu cumprimento, sendo a prestação de serviços, e não o acordo de vontades, o que faz com que o trabalhador se encontre amparado pela legislação trabalhista”.
Além disso, a julgadora pontuou que a prestação de serviço é a hipótese ou o pressuposto necessário para a aplicação do Direito do Trabalho, que depende cada vez menos de uma relação jurídica subjetiva do que de uma situação objetiva, cuja existência é independente do ato que condiciona seu nascimento. Para a juíza, é errôneo pretender julgar a natureza de uma relação de acordo com o que as partes tiverem pactuado, uma vez que, se as estipulações consignadas no contrato não correspondem à realidade, carecerão de qualquer valor.
De acordo com o artigo 3º da CLT, considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual ao empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Já o empregador é definido em lei (CLT, artigo 2º) como a empresa individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços. Ainda pode haver recurso dessa decisão ao TRT-MG.
Processo Relacionado: 0010511-84.2021.5.03.0140 (ATSum)
Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região